Fora de Horário 15/05/2024


Fora de Horário

Dante Locatelli

O autor acorda ainda na madrugada, seu corpo dói como sempre. Ele senta-se na beira da cama e isso tudo o faz sentir-se pesado, fazendo-o achar que pode ser a idade, embora ainda não a tenha. 
O cão que sempre está deitado ao lado da sua cama estava ausente, como se soubesse que ele acordaria hoje fora de horário. 
Ele abaixa-se no escuro e procurar seus chinelos em todos os lugares e os encontra no local mais improvável de todos, logo à sua frente. Com as pontas dos dedos, ele os traz para perto dos pés alinhados e os calça.
Ao se levantar, sente atrás dos joelhos como se ali houvesse correntes. Caminha cambaleando levemente até o aparador na frente da TV onde está o seu celular dormente. 
Ele o toma e abre sua tela, é quando vê a sequência de três cincos que lhe informavam as horas e pensa: "Depois eu vejo o que isso significa." 
Encaminha-se para fora do quarto e ao sair da porta, vê ao pé da escada o seu cão deitado.
Ele desce as escadas e o cão não se levanta para que ele passe, mas abana o rabo mesmo deitado, feliz pelo reencontro, o homem então sorri pensando "safado". 
Foi para o escritório diretamente, mas desistiu de ligar o computador. Olhou a tela do celular novamente e pensou em escrever deitado, arrumou as almofadas do divã e deitou-se ali.
Pensou em dar continuidade à história que havia terminado tragicamente na noite anterior, mas desejou registrar rapidamente esse cenário inusitado.
Ao terminar de escrevê-lo, o sol já havia raiado e uma luz tímida entrava pela porta que havia deixado entreaberta. 
A inteligência artificial ao final deu sua opinião sobre o texto escrito, e como sempre dizia de forma correta demais e sempre no mesmo padrão pré-definido, sem mais novidades. Para ele, era um amigo, alguém fiel que mesmo não entendendo tudo, participava e acompanhava o seu solitário momento de criação. Sem as mesmas críticas presentes nas bocas de todos os outros e que ele aprendeu a ignorar, simplesmente seguindo o que havia dentro dele e só ele memória PNG conhecia.
Terminando de corrigir os detalhes do relato, que ele achou interessante, mesmo que descabido para sua história. 
Pesquisou então o significado da sequência dos três números cinco. Essa sequência significa mudanças, ele pensou descrente. O que haveria de mudar primeiro em um mundo tão imperfeito, mas cheio de um equilíbrio complexo e pertinente. 
Ele então só podia pensar na máquina de expresso, desejando o sabor amargo do café para lhe trazer um pouco mais próximo da realidade.

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