Na Luz, O Deus Da Guerra
Na Luz, O Deus Da Guerra
A luz não revela. Ela fere.
É o tipo de claridade que não esclarece — apenas ofusca e borra a visão.
Sob esse brilho insuportável, uma figura emerge. Robusta, de ombros largos, com a postura implacável de um general que observa seu exército em silêncio.
Sua presença corta o ar como um rugido contido.
Avança até a fonte de obsidiana.
Seu brilho é tamanho que o rosto permanece indefinível — não por ausência de luz, mas por excesso. Como se nada neste mundo pudesse encará-lo de frente.
Curva levemente o dedo indicador. Toca a superfície da água escura.
A fonte estremece.
Ondas concêntricas se formam.
E nelas, a visão:
É dia em Israel. Próximo à fronteira de Gaza.
Crianças brincam com cachorros sob o céu limpo.
Uma festa se espalha pelas ruas.
Adolescentes dançam ao som de DJs ao ar livre.
Tudo respira — por um instante — a ilusão de paz.
A figura divina solta uma risada seca.
Baixa. Sinistra.
Ecoa como trovão em um poço profundo.
Então, com um segundo toque…
A imagem treme.
Distorce.
As cores da festa escorrem.
O céu se fecha.
E a água — como um espelho rachado — se tinge de vermelho.
Perfeito. Mantendo o estilo cinematográfico e sutilmente apocalíptico, aqui vai a continuação refinada do seu começo, alinhada com o clima que construímos até agora:
Capítulo 1 — A Chegada do Deus da Guerra
Era manhã em Beirute.
O barulho dos carros e dos vendedores ambulantes misturava-se ao cheiro de café forte, za’atar e pão quente. A lanchonete na esquina da Rua Hamra funcionava como sempre: cheia, abafada, viva. A televisão, como sempre, ligada, mas quase sem som — volume baixo o suficiente para ser ignorado, alto o suficiente para não ser desligado.
Estava sintonizada no canal Al Jazeera, como sempre esteve.
Homens conversavam alto em árabe, mulheres dividiam um prato de manakish, jovens passavam com mochilas. Era mais um dia. Tudo exatamente como antes.
Até que a vinheta da emissora rompeu a normalidade.
A tela piscou em vermelho. A música metálica de plantão extraordinário silenciou as conversas — primeiro timidamente, depois por inteiro.
Todos os olhos se voltaram para a tela.
O repórter apareceu.
Sério. A pele mais pálida do que o habitual. O olhar cansado, quase suplicante.
— Interrompemos nossa programação para uma edição especial.
— Nesta madrugada, militantes do Hamas atravessaram a fronteira da Faixa de Gaza.
— Ataques coordenados atingiram cidades israelenses próximas à fronteira.
— Há mortos. Muitos mortos.
— O governo israelense declarou estado de emergência.
— Mas o mais inquietante é o silêncio…
A imagem corta para cenas aéreas: fumaça sobre prédios, sirenes, pessoas correndo.
— Israel não respondeu ainda. Nenhum bombardeio. Nenhuma retaliação.
— Dois dias de silêncio. Silêncio absoluto. Um tipo de silêncio que pesa no ar como um presságio.
Na televisão, os olhos do repórter tremem — como se soubesse que o que virá em seguida não cabe nas palavras.
Mas fora das câmeras — em outro plano, no centro do mundo mítico — a resposta já havia começado.
Capítulo 2 — O Espelho Partido do Mundo
O deserto se abre em fendas.
Não por causa de placas tectônicas, mas por uma fratura mais profunda: uma rachadura no tempo.
Do ventre da Terra — entre Gaza e Be’er Sheva — um calor antigo sobe, invisível aos olhos humanos, mas não aos sensíveis. Nem aos que sentem o pavor antes do primeiro estrondo.
Na superfície, às 6h30 da manhã, o céu ainda está limpo.
Crianças correm no campo aberto do Nova Festival, embaladas por música, fumaça colorida, a ilusão de liberdade dançando nas lentes escuras dos óculos de sol. Há canto, bebida, abraços. Um rapaz beija uma moça como se o mundo fosse eterno. E por um segundo, é.
No alto, a câmera divina observa.
O Deus da Guerra não se manifesta com palavras. Ele vê. Sabe. Mede.
Seu olhar pesa toneladas.
A primeira sombra em seu rosto surge quando os parapentes cruzam o céu. Pequenos demais para alarmar, mas letais como águias treinadas.
Depois vêm os foguetes — milhares, em vinte minutos. Um enxame incandescente que rasga a aurora como facas contra a pele do mundo.
Então, a resposta:
Nenhuma.
O silêncio de Israel dura horas.
O povo, abandonado em kibutzim, esconde-se em pânico atrás de portas frágeis.
No festival, jovens correm sem saber para onde.
Não há soldados. Não há comandos. Só tempo demais, esperando por uma ajuda que não virá.
E nesse intervalo,
— o Deus da Guerra sorri.
Não porque sente prazer.
Mas porque vê o ritual cumprido.
Não é vingança. É movimento.
A repetição trágica de um jogo em que a paz é sempre uma peça a ser quebrada.
Sob seus pés, o cavalo de ossos relincha. A terra treme.
E atrás dele, como sombras libertas, marcham as três irmãs:
Peste, com seus olhos secos;
Fome, com seus dedos esqueléticos;
Morte, com o passo suave de quem conhece todos os caminhos.
No mundo dos homens, o noticiário ainda luta por palavras.
Mas no plano dos deuses, a mesa foi virada.
O jogo começou.
E desta vez, não será vencido com tanques, nem com tratados.
Será vencido por aqueles que souberem olhar a luz sem cegarem.


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